Freud, Sigmund (1996u). Psicologia dos grupos e análise do Ego. In Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud vol. XVIII. Rio de Janeiro: Imago. (Obra original publicada em 1921).
A citação se encontra em “Psicologia dos grupos e análise do Ego” (1921) no pós-escrito, página 145. Freud realiza a distinção entre a identificação do Eu com um objeto e a substituição do ideal do Eu por um objeto, para isso recorre aos exemplos do exército e da Igreja católica.
A distinção entre a identificação do ego com um objeto e a substituição do ideal do ego por um objeto encontra uma ilustração interessante nos dois grandes grupos artificiais que começamos por estudar, o exército e a Igreja cristã. É óbvio que um soldado toma o seu superior, que é, na realidade, o líder do exército, como seu ideal, enquanto se identifica com os seus iguais e deriva dessa comunidade de seus egos as obrigações de prestar ajuda mútua e partilhar das posses que o companheirismo implica. Mas, se tenta identificar-se com o general, torna-se ridículo. O soldado em Wallensteins Lager ri do sargento por essa mesma razão:
Wie er räuspert und wie er spuckt, Das habt ihr ihm glücklich abgeguckt! [1]
É diferente na Igreja católica. Todo cristão ama Cristo como seu ideal e sente-se unido a todos os outros cristãos pelo vínculo da identificação. Mas a Igreja exige mais dele. Tem também de identificar-se com Cristo e amar todos os outros cristãos como Cristo os amou. Em ambos os pontos, portanto, a Igreja exige que a posição da libido fornecida pela formação grupal seja suplementada. Há que acrescentar a identificação ali onde a escolha objetal já se realizou, e o amor objetal onde há identificação. Esse acréscimo, evidentemente, vai além da constituição do grupo. Pode-se ser um bom cristão e, contudo, estar distante da idéia de se pôr no lugar de Cristo e ter, como ele, um amor abrangente pela humanidade. Não precisamos nos sentir capazes, fracos mortais que somos, da grandeza de alma e da força de amor do Salvador. Porém, esse novo desenvolvimento na distribuição da libido no grupo constitui provavelmente o fator sobre o qual o cristianismo baseia sua alegação de haver atingido um nível ético mais elevado.
1 [Posso garantir-lhe, sua imitação combina perfeitamente, Com a maneira por que pigarreia e a maneira por que cospe. (Cena 6 da peça de Schiller.)] (Freud, 1996u, p. 145).
Wallestein
06/11/2025 00:00