Freud, Sigmund (1996c). A interpretação dos sonhos. In Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud vol. IV. Rio de Janeiro: Imago. (Obra original publicada em 1900).
A citação encontra-se em “A interpretação dos sonhos”, no capítulo V, intitulado “O material e as fontes dos sonhos”, seção (B): o material infantil como fonte dos sonhos, página 236. Segundo a nota de Strachey (1996c), Freud inspira-se na peça Iphigenie auf Tauris para fazer associações com a palavra Gotter e Goethe, ao tratar sobre trocadilhos jocosos com seu próprio nome e o de Goethe.
Poderia continuar a seguir as intricadas seqüências de idéias dentro dessa linha e explicar completamente a parte do sonho que ainda não analisei; mas devo desistir neste ponto, porque o sacrifício pessoal exigido seria grande demais. Apanharei apenas um dos fios da meada, que está apto a nos levar diretamente a um dos pensamentos do sonho subjacentes a essa confusão. O estranho de rosto alongado e barba pontuda que tentou impedir que eu vestisse o sobretudo tinhas as feições de um lojista de Spalato, de quem minha mulher comprara diversos artigos turcos. Chamava-se Popovi, nome equívoco sobre o qual um escritor humorístico, Stettenheim, já fez um comentário sugestivo: “Ele me disse o nome e, enrubescendo, pressionou minha mão.” Mais uma vez, apanhei-me fazendo mau uso de um nome, como já fizera com Pélagie, Knödl, Brücke e Fleischl. Seria difícil negar que brincar com nomes dessa maneira era uma espécie de travessura infantil. Mas, se eu me entregava a isso, era como um ato de retaliação, pois meu próprio nome fora alvo de gracejos leves como esses em incontáveis ocasiões. Goethe, lembrei-me, comentara em algum lugar a sensibilidade das pessoas em relação a seus nomes: como parecemos transformarmo-nos neles como se fossem nossa própria pele. Ele dissera isso à propos de um verso escrito sobre seu nome por Herder: “Der du von Göttern abstammst, von Gothen oder vom Kote.” -“So seid ihr Götterbilder auch zu Staub”. (Freud, 1996c, p. 236)
Nota de rodapé: O primeiro desses versos vem de um bilhete jocoso escrito por Herder a Goethe, com o pedido de empréstimo de alguns livros: "Tu que és o rebento dos deuses ou dos Godos ou do esterco - (Goethe, manda-os para mim!)". O segundo verso, uma outra associação livre de Freud, é tirado da famosa cena do reconhecimento de Iphigenie auf Tauris, de Goethe. Ifigênia, sabendo por intermédio de Pilades da morte de tantos heróis durante o cerco de Tróia, exclama: "Também vós divinas figuras, vos transformastes em pó! (Strachey, 1996c, p. 236).
Goethe, Iphigenie auf Tauris, Ifigênia em Táuride
10/11/2025 00:00