Hamlet - 26ª referência

Freud, Sigmund (1996ii). A questão da análise leiga. In Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud vol. XX. Rio de Janeiro: Imago. (Obra original publicada em 1926).

A citação encontra-se em “A questão da análise leiga” (1926), página 182. No trecho, Freud explica a uma Pessoa Imparcial no que consiste o método psicanalítico, ressaltando a centralidade da palavra.

Durante essa indagação sobre os sintomas dos neuróticos, a Pessoa Imparcial, que imagino estar presente, vem mostrando sinais de impaciência. Nesse ponto, contudo, ela se torna atenta e interessada. ‘Então agora’, diz ela ‘saberemos o que o analista faz com o paciente a quem o médico foi incapaz de ajudar’.

Nada acontece entre eles, salvo que conversam entre si. O analista não faz uso de qualquer instrumento - nem mesmo para examinar o paciente - nem receita quaisquer remédios. Se mesmo for possível, deixa até o paciente em seu ambiente e no seu modo de vida habitual durante o tratamento. Essa não é uma condição necessária, naturalmente, e talvez nem sempre seja praticável. O analista concorda em fixar um horário com o paciente, faz com que ele fale, ouve o que ele diz, por sua vez conversa com ele e faz com que ele ouça As feições da Pessoa Imparcial agora revelam sinais de alívio e relaxamento inegáveis, mas também traem claramente certo desprezo. É como se ela estivesse pensando: ‘Nada mais do que isto? Palavras, palavras, palavras, como diz o príncipe Hamlet.’ E sem dúvida ela também está pensando na fala zombeteira de Mefistófeles sobre com que conforto se pode ir passando com palavras [1] - versos que nenhum alemão jamais esquecerá.

‘Assim é uma espécie de mágica’, comenta ela: ‘O senhor fala e dissipa seus males.’ Isto mesmo. Seria mágica se surtisse efeito um pouco mais rapidamente. Um atributo essencial de um mágico é a rapidez - poder-se-ia dizer a subitaneidade - do sucesso. Mas os tratamentos analíticos levam meses e mesmo anos: mágica tão lenta perde seu caráter miraculoso. E incidentalmente não desprezemos a palavra. Afinal de contas, ela é um instrumento poderoso; é o meio pelo qual transmitimos nossos sentimentos a outros, nosso método de influenciar outras pessoas. As palavras podem fazer um bem indizível e causar terríveis feridas. Sem dúvida ‘no começo foi a ação’ [2] e a palavra veio depois; em certas circunstâncias ela significou um progresso da civilização quando os atos foram amaciados em palavras. Mas originalmente a palavra foi magia - um ato mágico; e conservou muito de seu antigo poder” (Freud, 1996ii, p. 182).

Nota de rodapé 1: [Na cena com o estudante em Fausto, Parte I, cena 4] Nota de rodapé 2: [‘Im Anfang war die Tat’ (Goethe, Fausto, Parte I, cena 3). Freud concluiu seu Totem e Tabu (1912-13) com essa mesma citação.]

Shakespeare, Hamlet

08/11/2025 00:00