Fausto - 10ª referência

Masson, Jeffrey Moussaief (1986). Carta de carta de 27 de setembro de 1898. In A correspondência completa de Sigmund Freud para Wilhelm Fliess (1887-1904). Rio de Janeiro: Imago.

A citação encontra-se no capítulo intitulado “A interpretação dos sonhos”, conforme a divisão feita pelo editor das cartas, páginas 329-330. Freud, nesta carta, faz uma breve análise de um caso de um rapaz, cuja vergonha por andar de forma diferente devido à rigidez anormal das pernas é estudada por Freud como sendo correspondente a outros fatores, passíveis de serem destacados na infância. Após a breve exposição do caso, Freud recorre a um trecho de Fausto, para expressar que o caminho pelo qual segue sua análise é passível de muitas incertezas.

Um sujeito de 25 anos que mal consegue andar, por causa de rigidez nas pernas, cãibras, tremores e assim por diante. Uma salvaguarda contra qualquer erro de diagnóstico é fornecida pela angústia concomitante, que o faz agarrar-se às saias da mãe como o bebê que um dia foi. A morte do irmão e a morte do pai numa psicose precipitaram o aparecimento dos sintomas, que estão presentes desde os 14 anos. Ele se sente envergonhado quando alguém o vê andar dessa maneira e considera isso normal. Protótipo: um tio tabético com quem ele já se identificava aos 13 anos, por causa da etiologia aceita [de tabes] (levar uma vida dissoluta). A propósito, fisicamente, o sujeito é um urso! Queria observar que a vergonha é apenas acoplada aos sintomas e deve corresponder a outros fatores precipitantes. Ele chegou até a permitir|-me| esclarecer que o tio, afinal, não se envergonha nem um pouco do andar que tem. A ligação entre a vergonha e o andar estava certa anos atrás, quando ele teve gonorréia, a qual, é claro, era perceptível no andar, e também numa época ainda anterior, quando as ereções constantes (sem objetivo) interferiam no seu andar. Além disso, a causa da vergonha estava num nível mais profundo. Ele me contou que, no ano passado, quando eles moravam à margem do rio Wien (no interior), este começou repentinamente a subir; ele foi tomado de um medo terrível de que a água chegasse até sua cama, ou seja, de que inundasse seu quarto, e isso, durante a noite. Faça o favor de reparar na ambigüidade da expressão; fiquei sabendo que o homem tinha o costume de urinar na cama quando menino. Cinco minutos depois, ele me disse espontaneamente que, quando estava na escola, ainda molhava regularmente a cama, e que a mãe o havia ameaçado de contar isso ao professor e a todos os seus colegas de classe. |O rapaz| havia sentido uma angústia terrível. É com isso que se relaciona a vergonha. Toda a história da juventude dele, por um lado, tem seu clímax nos sintomas das pernas e, por outro, libera o afeto relativo a ela, e agora os dois se estão juntando em sua percepção interna. Toda a história submersa da infância precisa ser inserida entre os dois.

Ora, uma criança que molha habitualmente a cama até os sete anos (sem ser epiléptica ou coisa parecida) deve ter experimentado alguma excitação sexual em época mais precoce da infância. Espontânea ou por sedução? Aí está, e isso deve conter também a determinação mais específica no tocante às pernas.

Como vê, se houver necessidade, posso dizer a mim mesmo: "Ê verdade que sou mais esperto do que todos os pretensiosos...", mas a triste frase que vem a seguir também não deixa de se aplicar a mim: “Vou levando minha gente a me seguir às cegas e vejo que não sabemos coisa alguma (Masson, 1986, p. 329-330).

Há uma nota do editor que destaca que Freud faz menção à citação:

"Vou levando minha gente a me seguir às cegas e vejo que não sabemos coisa alguma”, está presente no solilóquio de abertura de Fausto (Masson, 1986, p. 331).

Goethe, Fausto

10/11/2025 00:00