Masson, Jeffrey Moussaief (1986). Carta de 04 de outubro de 1897. In A correspondência completa de Sigmund Freud para Wilhelm Fliess (1887-1904). Rio de Janeiro: Imago.
A citação encontra-se no capítulo “A teoria transformada”, conforme a divisão feita pelo editor das cartas, página 270. Nela, Freud relata um de seus sonhos a Fliess. Ao mencionar a imagem onírica do crânio de um pequeno animal, menciona Goethe. Provavelmente, essa menção diz respeito a um crânio de ovelha encontrada por Goethe em um sonho, no Lido de Veneza, que deu ao poeta a ideia da chamada teoria ‘vertebral’ do crânio:
4 de outubro. As crianças chegaram. Acabou-se o bom tempo. O sonho de hoje trouxe o seguinte, sob os mais estranhos disfarces: ela era minha mestra em assuntos sexuais e reclamava por eu ser desajeitado e incapaz de fazer qualquer coisa. (A impotência neurótica sempre aparece dessa maneira. O medo de não ser capaz de fazer nada na escola assim obtém seu substrato sexual.) Ao mesmo tempo, eu via o crânio de um pequeno animal e, no sonho pensava em ‘porco’, mas, na análise, associei isso com seu desejo de dois anos atrás de que eu encontrasse no Lido, como fez Goethe, um crânio que me pudesse esclarecer. Mas não o encontrei. Portanto, |fui| uma “cabeça dura” [literalmente, uma cabeça de ovelha]. Todo o sonho estava repleto das mais mortificantes alusões a minha impotência atual como terapeuta. Talvez seja disso que decorre a inclinação a acreditar na incurabilidade da histeria. Além do mais, ela me lavava numa água avermelhada em que se havia banhado antes. (A interpretação não é difícil; não encontro nada semelhante a isso na cadeia de minhas lembranças; portanto, encaro-o como uma autêntica descoberta do passado distante.) E ela me fazia furtar zehners (moedas de dez kreuzers) (2) e dá-los a ela. Há uma longa seqüência que vai desde esses primeiros zehners de prata até a pilha de notas de dez florins que vi no sonho como o dinheiro das despesas domésticas semanais de Martha. O sonho poderia ser resumido como “mau tratamento”. Assim como a velha recebia dinheiro de mim pelo mau tratamento que me dispensava, hoje recebo dinheiro pelo mau tratamento dado a meus pacientes. Um papel especial foi desempenhado pela Sra. Q., cujo comentário você me relatou: que eu não deveria cobrar nada dela, já que era esposa de um colega (ele, é claro, impôs a condição de que eu cobrasse) (Masson, 1986, p. 270).
Goethe
09/11/2025 00:00