Freud, Sigmund (1996yy). Sobre o início do tratamento (Novas recomendações sobre a técnica da Psicanálise I). In Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud vol. XII. Rio de Janeiro: Imago. (Obra original publicada em 1913).
A citação encontra-se em “Sobre o início do tratamento (Novas recomendações sobre a técnica da Psicanálise I)” (1913), páginas 150-151, na segunda nota de rodapé. Nesta, Freud trata da regra fundamental da psicanálise, isto é, que o paciente diga tudo que lhe vem à mente sem censurar-se ou ocultar algo que lhe pareça pouco importante. Sobre isso, Freud apresenta alguns casos em que isto se tornou uma dificuldade.
Nota de rodapé 2: Muito se poderia dizer a respeito de nossas experiências com a regra fundamental da psicanálise. Ocasionalmente deparamos com pessoas que comportam como se houvessem estabelecido essa regra para si mesmas. Outras transgridem-na desde o início. É indispensável, e também vantajoso, estabelecer a regra nos primeiros estádios do tratamento. Mais tarde, sob o domínio das resistências, a obediência a ela se enfraquece e chega a ocasião, em toda análise, quão irresistível é a tentação de render-nos àqueles pretextos apresentados pelo julgamento crítico para rejeitar certas ideias. Quão pequeno é o efeito de acordos, como que se faz com o paciente ao estabelecer a regra fundamental, é fato regularmente demonstrado quando algo íntimo sobre uma terceira pessoa surge em sua mente pela primeira vez. Ele sabe que deve dizer tudo, mas transforma a discrição sobre outras pessoas em novo obstáculo. ‘devo realmente dizer tudo? pensei que só se aplicava as coisas que me concernissem..’ É naturalmente impossível efetuar a análise se as relações do paciente com outras pessoas e seus pensamentos sobre elas são excluídos. Pour fair une omellette il faut casser des oeuf.
Um homem honrado esquece prontamente assuntos particulares de estranho que não lhe pareçam importante conhecer. Tampouco se pode abrir exceção no caso de nomes. Doutra maneira, as narrativas do paciente tornar-se-iam um pouco indistintas, como as cenas na peça de Goethe, Die natürliche Tochte [A filha natural], e não se alojariam na memória do médico. Além disso, os nomes que são retidos encobrem o acesso a todo tipo de vinculações importantes. Mas talvez se possa deixar os nomes de lado até que o paciente se tenha familiarizado mais com o médio e com o procedimento da análise. é notável como toda a tarefa se torna impossível se permite reserva mesmo em um único lugar. Mas temos somente de refletir sobre o que aconteceria se, em certo ponto de uma cidade, existisse o direito de asilo; quanto tempo se passaria até que toda a ralé da cidade lá se houvesse reunido? Certa vez tratei de um alto funcionário que estava obrigado, por juramento de ofício, a não comunicar certas coisas, por constituírem, segredos de Estado, e análise malogrou-se em consequência desta restrição. O tratamento psicanalítico não deve dar atenção à qualquer consideração, porque a neurose e suas resistências não recebem, elas próprias, qualquer atenção deste tipo (Freud, 1996yy, p. 150-151).
Goethe, Die natürliche Tochte, A filha natural
10/11/2025 00:00